sexta-feira, 25 de março de 2016

TRÊS VERSÕES DE ESPARTACO




Como é bom ler romance históricos!!!! Acabo de ler o livro de Espartaco, Howard Fast.

Sempre evitei ler versões de histórias em literatura depois de conhece-las em filmes. Mas no caso da genial e comovente Espartaco não deu, li logo o livro assim que o tive em mãos.

Espartaco é um personagem histórico, ex-gladiador, liderou um exército com homens e mulheres que fugiam da escravização. Não me peçam para demonstrar o que foi histórico e o que foi literatura. Mas a verdade é que na história que conheci ele nasceu escravo e era koruu, ou seja, filho e neto de escravos. Trabalhou em uma mina na Líbia, foi comprado por um lanista (negociante e treinador de gladiadores) e levado para Kapua para ser treinado nas artes de combate. Lá pelas tantas dos acontecimentos os escravos fazem um motim, conseguem a liberdade, vão libertando escravos em várias localidades e formam um exército qua combateu contra Roma.
Tanto o personagem histórico quanto as três narrativas escancaram a legitimidade dos oprimidos em se rebelarem e o valor da luta por liberdade. Mais do que isso, retratam que as bases do que chamamos civilização e do estado é, no fundo, pura violência e controle social.

Espartaco foi o símbolo da revolta do povo, cujas ações ameaçaram de fato o poder. Tanto é verdade que Roma dispensou grande quantidade de recursos e sangue de soldados para vencê-lo.  Charles Hainchelin em A Origem da Religião, chegou a especular que se o exército de escravos tivesse vencido Roma, hoje não seríamos cristãos. Espartaco seria uma espécie de substituto materialista de cristo. Enquanto Jesus morreu na cruz como o salvador e prometia salvação após a morte, o líder dos escravos prometia libertar o homem na Terra, e foi crucificado junto aos seus iguais.

Recomendo as três versões, porém, se for escolher uma delas, escolha o livro de Howard Fast.  Na maioria das vezes, penso eu, a arte literária nos dá muito mais que o cinema. Apesar disso, o filme de Stanley Kubrick de 1960 foi simplesmente o melhor filme que já vi!!!  É interessante que no livro Espartaco não aparece tanto nas cenas. Howard Fast muitas vezes lança mão dos efeitos flash back, em que os acontecimentos são contados pelos próprios personagens. Espartaco aparece muito menos que nos filmes. Esta liberdade proporcionada pela literatura acho que complicaria o grande épico filmado 1960, que foi narrado de forma bastante linear. 

De qualquer forma na versão de Stanley Kubrick incluiu cenas simplesmente memoráveis, como quando os escravos dizem que todos eles eram Espartaco (já chorou vendo-a) e a cena final em que Varinia, sua mulher, apresenta-lhe o filho do casal durante a crucificação de Espartaco.

Já o filme mais recente, de Robert Dornhelm, me deixou um pouco irritado no começo, pois gostei tanto da primeira versão que senti que estava vendo um pecado ao perceber a história sendo contada de outra maneira. Ao longo das cenas percebi que Espartaco era retratado de forma mais humanizada e não como um herói como no épico dos anos 60. No final admiti que o filme é muito bem feito e também vale a pena.

Por isso, se forem escolher, vejam todas as três versões deste fantástico símbolo das lutas dos oprimidos.


quinta-feira, 17 de março de 2016

FARSAS DO PUNITIVISMO PETISTA E DA OPOSIÇÃO


       As últimas semanas foram bombardeadas pela mídia e pelas redes sociais com constantes notícias sobre as tentativas de impeachmar a Dilma e de aprisionar Lula. Tudo veiculado, infelizmente, por uma mídia não investigativa, sem pensamento crítico nem ceticismo, que vomita discursos acusatórios com argumentação rasa e que encontra um alto-falante em um grande público também habituado ao simplismo intelectual.
      Não me interessa aqui, me embrenhar nos pormenores legais e jornalísticos. Acho que reduzir a discussão a isto esconde as verdadeiras questões de fundo, que são políticas. A facilidade com que pessoas vão presas em nosso pais, em sua maioria negros e pobres, deixa claro o projeto punitivista dos nossos magistrados e da imprensa. Como confiar que sistema judiciário tão classista possa fazer justiça? Como acreditar em notícias vindas de um jornalismo que em grande parte incita constantemente a população contra os menos favorecidos, como nos programas policiais de TV? 

    Discursos punitivos e linchatórios são cotidianamente usados pelo estado e por boa parte da população como arma política contra os mais pobres. Em uma época em que a população se volta contra o governo, nada mais natural que tal ira recaia sobre os detentores do poder.

      Muito se escreveu na internet sobre o porquê o PT é o algo principal das acusações de corrupção e não outros setores da direita. Quero lembrar que, apesar de isto ser verdade, o PT alimentou o crocodilo que hoje quer comê-lo. Nosso pais se tornou a terceira população carcerária do mundo no governo petista. Ocupações militares em favelas e massacres de índios e camponeses também são tristes marcas recentes das ações do governo federal, violências largamente maiores que a coerção que nosso ex-presidente foi recentemente submetido. Se ele sofre tentativa de linchamento público, está sofrendo as consequências da dissimilação do fascismo que teve oportunidade de enfrentar e não enfrentou.
      Se existe algum mártir este mártir é a população mais pobre. Tornar herói um dos cúmplices de tanta violência de estado é manchar as mãos de sangue, é antes de tudo cinismo.

      O mais importante agora, penso eu, é refletirmos sobre como as pessoas reagem aos acontecimentos. Percebi no facebook muitas tendências. Há os que aderem ao discurso de ódio e de justiçamento. No campo mais à esquerda, há os que querem proteger o estado burguês de um possível golpe de setores ainda mais conservadores. Os mais revolucionários vêm em tudo isso um sintoma de enfraquecimento do estado e etc. Por outro lado, acho que falta refletirmos sobre porque tanta gente acredita tanto em punições como forma de resolução de problemas políticos, mesmo entre as pessoas mais à esquerda que pedem que as investigações da Lava Jato se estendam a políticos da oposição.

      Imaginemos que Lula fosse preso e Dilma saísse da presidência, certamente muita gente ficaria feliz. Ficariam com a sensação de alivio dos vingados, comum ao público que sente que suas liberdades individuais devem ser protegidas pelo estado. Já trabalham honestamente, pagam seus impostos... nada mais justo que o estado tire de cena aqueles que atrapalham estes “cidadãos de bem”. É como se Lula fosse o negrinho intruso no shopping-center amedrontando e estragando a festa dos playboys.   

     Porém o que a retirada de Dilma e Lula de fato melhoraria em nossas vidas? Michel Temer ficaria com o poder, Aécio Neves seria eleito daqui a três anos. E daí? O que nos asseguraria o fornecimento de melhores serviços sociais e diminuição das desigualdades sociais? Nada.
      O mesmo raciocínio pode ser feito ao encarceramento em massa de nossa população pobre, preta e periférica. Engaiolar pessoas em uma prisão insalubres as deixam melhor? Nos garantiria mais segurança?  A realidade mostra que não.
      Agora imagine que as punições de fato se estendessem aos políticos de oposição. Penso que a tendência seria o seguinte: A discussão política ficaria sempre atrelada aos trâmites investigativos e judiciários. Descobriríamos que um determinado político ou partido são corruptos e os substituiríamos para depois de um tempo descobrirmos que os substitutos também faziam o mesmo. Ou seja, nunca chegaríamos às raízes da corrupção. 

     Poderíamos fazer uma pergunta ainda mais profunda: as pessoas que hoje pedem o impeachment da Dilma e a prisão de Lula acreditam que isso de fato diminuiria a corrupção no Brasil?  Será que eles querem mesmo que o estado forneça melhores serviços sociais e diminuía as desigualdades sociais?  Sinceramente acho que não. Nem a era FHC nem a era Lula/Dilma não fizeram muito mais que porcamente administrar nossa miséria. Eles sabem disso e não é por ingenuidade que podem mais punição, é por cinismo.
      Por isso deixo um alerta à esquerda que pede punição à oposição. Foquem as críticas no cenário político. Se perdermos esta discussão, o risco não é só sofrermos com o enrijecimento penal da sociedade e da política, mas darmos força a atores políticos que sempre jogam nossos reais problema para de baixo do tapete.